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"Praticamente nasci em cima de um cavalo"

Desde o primeiro contacto com o mundo equestre, Alexandre Mascarenhas de Lemos soube que o seu destino estava traçado entre pistas e arreios. Herdeiro de uma referência incontornável do hipismo português, partilha com o pai o apelido e a paixão pelos cavalos, mas trilha, com convicção, um caminho próprio.

 

Quando começou a montar a cavalo e em que momento percebeu que queria seguir o caminho de cavaleiro de competição? Foi algo natural por herança ou uma escolha sua?

Costumo dizer que praticamente nasci em cima de um cavalo. Comecei a montar aos oito anos, muito influenciado pelo meu pai e pelo meu irmão Salvador, que já viviam o universo equestre com intensidade. Em casa, os cavalos eram tema constante, parte da rotina e do imaginário familiar. Recordo o meu primeiro pónei, o Dalton, com enorme carinho. Foi com ele que aprendi o valor da confiança e da entrega, fundamentos que ainda hoje orientam a minha relação com cada cavalo.

Seguir este caminho foi, ao mesmo tempo, natural e profundamente consciente. A convivência com o desporto, com a exigência técnica e com a paixão do meu pai mostrou-me que queria dedicar a minha vida a esta arte: a de criar, compreender e competir em perfeita sintonia com o cavalo.

 

Tendo o seu pai com o mesmo nome e já com uma carreira consolidada, sente pressão ou inspiração? Como lida com a comparação entre gerações?

Partilhar o nome do meu pai é uma honra e um compromisso. Cresci a observar-lhe a disciplina, a atenção ao detalhe e o respeito absoluto pelo cavalo, valores que procuro transportar para a minha própria forma de estar. As comparações são inevitáveis, sobretudo porque, por vezes, montamos os mesmos cavalos. Mas encaro-as como uma forma de reconhecimento. Ser comparado a um cavaleiro com a experiência, a visão e o percurso do meu pai é, para mim, um elogio.

Mais do que sentir pressão, procuro inspiração. A sua carreira é um referencial técnico e humano, e o meu objectivo é acrescentar a essa herança uma dimensão própria, com a mesma seriedade e a mesma ambição de excelência.

 

Pode falar-nos dos seus cavalos mais importantes, actualmente e no passado, e qual é aquele com quem tem uma ligação especial? Há algum que esteja particularmente empenhado em projectar nos próximos anos?

Ao longo dos anos, tive a sorte de montar cavalos muito distintos, mas o Classico 70 ocupa um lugar especial. Desde o primeiro momento, criou-se uma ligação quase intuitiva, uma linguagem silenciosa que dispensa gestos excessivos. É um cavalo de 12 anos, filho de Chin Chin e Caretino, com uma combinação rara de energia, sensibilidade e inteligência. Dentro da pista, revela potência e uma concentração notável; fora dela, é dócil, atento e transmite uma serenidade contagiante.

O Classico compete regularmente em Grandes Prémios de 1,45 m e 1,50 m, e é, sem dúvida, um cavalo com características que o colocam entre os mais completos do circuito. O meu objectivo é continuar a potenciar o seu talento, consolidar vitórias e evoluir no ranking FEI. O que mais me fascina é perceber que cada progresso técnico nasce da confiança mútua. É isso que transforma o desporto em arte.

 

Sabemos que também desenvolve actividades fora do hipismo. Como concilia esses mundos com a exigência dos treinos e das competições?

A preparação física e mental é uma extensão natural do treino técnico. No ginásio, trabalho o equilíbrio, a estabilidade e a mobilidade, pilares fundamentais para uma equitação precisa. Pratico kickboxing para desenvolver foco, resistência e capacidade de reacção. É um exercício de corpo e mente, muito semelhante ao que acontece na pista: cada movimento conta, e a leitura do momento é decisiva.

Acredito profundamente que o cavalo reflecte o estado interior do cavaleiro. Por isso, mantenho uma rotina rigorosa, que me permite chegar ao trabalho com a clareza e a energia que o desporto de alta competição exige.

Nos momentos de pausa, gosto de ler e de acompanhar o mundo.

 

Onde se vê dentro de cinco a dez anos no mundo do salto de obstáculos? Há provas internacionais, títulos ou parcerias que almeja atingir?

O meu foco está em competir nos palcos de maior prestígio mundial: o CHIO Aachen, o CSIO Spruce Meadows, o CHI Geneva e o The Dutch Masters. São provas que representam o auge técnico e emocional do nosso desporto. Paralelamente, quero continuar a afirmar-me no circuito da Global Champions Tour, que reúne a elite equestre mundial e exige uma consistência extraordinária ao longo de toda a temporada.

Mas o sucesso em saltos de obstáculos é, por natureza, um trabalho de equipa. O cavaleiro é apenas a face visível de uma estrutura complexa: o tratador, o ferrador, o veterinário e o treinador desempenham papéis essenciais. A precisão e a confiança entre todos são fundamentais. Gosto de pensar que o meu trabalho é como o mecanismo de um relógio suíço: cada engrenagem tem de funcionar em perfeita sincronização para que o conjunto alcance a precisão absoluta.

Com essa filosofia, e com a dedicação de toda a equipa, acredito que o futuro será construído passo a passo, com rigor, coragem e visão.

 

Que mensagem gostaria de deixar aos jovens cavaleiros em Portugal que o vêem como uma referência emergente? Que legado espera deixar no hipismo e na forma de conduzir a modalidade no país?

Acredito que o verdadeiro cavaleiro se define pela forma como compreende e respeita o seu cavalo. É nessa relação que reside a essência do nosso desporto. Procuro ser um exemplo de consistência, entrega e coerência, qualidades que, mais do que o talento natural, determinam a longevidade de uma carreira.

Quero criar um programa chamado Next Generation Riders, destinado a apoiar jovens cavaleiros portugueses, oferecendo formação, orientação técnica e oportunidades de desenvolvimento internacional. Há muito potencial em Portugal, mas faltam estruturas que transformem essa paixão em caminho. Quero contribuir para isso.

Mais do que títulos, pretendo deixar um legado de exigência, autenticidade e amor verdadeiro pelo cavalo, porque é nele que tudo começa e tudo termina.