“Cada relógio Breguet é um pedaço de história”
Descendente de 7ª geração do lendário relojoeiro Abraham-Louis Breguet, Emmanuel Breguet conhece a história da Maison como ninguém. Em conversa com a Turbilhão, o actual vice-presidente e responsável pelo Património da Breguet revela o que mais o encanta na marca fundada pelo seu antepassado.
Quando é que se apercebeu da importância do seu antepassado na história da relojoaria?
Acho que sempre soube que Abraham-Louis Breguet, cujo busto estava na sala dos meus pais, era alguém excepcional, embora a minha família não falasse muito sobre ele. Percebi a imensidão da sua genialidade quando comecei a mergulhar nos arquivos e a escrever sobre ele. Descobri não só uma grande mente científica, mas também um artista, um homem corajoso, respeitado por todas as elites do seu tempo; um homem cuja influência ainda é sentida hoje.
O seu envolvimento no mundo da relojoaria foi de alguma forma inevitável devido às suas raízes?
O meu envolvimento no mundo da relojoaria é fruto de uma escolha pessoal. Como sabe, a minha família vendeu a empresa de relógios Breguet há muito tempo, quase um século antes do meu nascimento! Eu era absolutamente livre para escolher qualquer carreira, mas sendo historiador de formação e muito interessado em relojoaria, ousei apresentar a minha candidatura a Montres Breguet, em 1993, e quase trinta anos depois, ainda estou aqui! E tive o privilégio de fazer tantas coisas interessantes: livros, artigos, exposições, viagens, criação do museu Breguet, para citar apenas alguns…
Qual é a invenção técnica de Abraham-Louis Breguet que mais admira?
Admiro a invenção do Turbilhão pela audácia: anular os efeitos da gravidade da Terra não é pouca coisa! Tivemos que ousar. E a palavra Turbilhão é bem escolhida. Evoca a regularidade de um sistema planetário, e esse era o significado da palavra nos séculos XVII e XVIII. O Turbilhão é representativo do espírito do Iluminismo: queremos compreender o mundo e domá-lo. A ascensão da ciência abre imensos horizontes.
Durante a vida do fundador Abraham-Louis, a empresa Breguet produziu milhares de relógios. Sabemos quantos deles ainda existem?
Abraham-Louis Breguet e o filho, Antoine-Louis Breguet, produziram cerca de 5000 peças. Dessas, acho que pelo menos 50% ainda existem, talvez mais. Todos os meses continuo a descobrir algumas peças antigas em Museus de todo o mundo, em colecções particulares que estão à venda em leilão. Somos solicitados por muitos proprietários de relógios antigos para determinar a autenticidade das suas peças. Para responder à sua pergunta, talvez 60% ainda existam… E para dar um exemplo muito preciso, quase 70% dos 40 turbilhões antigos feitos por Breguet sobrevivem. Verifiquei recentemente.
Qual a peça mais importante do passado na posse da Maison Breguet? E a mais valiosa?
É difícil citar apenas uma! Tivemos a oportunidade de comprar três Turbilhões antigos, de adquirir um dos três relógios de movimento duplo de Breguet (os outros dois estão num museu), de adquirir também o relógio táctil da Imperatriz Josefina, de ter o primeiro cronógrafo rattrapante. Cada relógio Breguet é um pedaço de história, um pedaço do património europeu. Tudo é precioso e valioso. Mesmo as peças mais simples produzidas por Breguet demonstram a sua genialidade. E não nos podemos esquecer que o bem mais valioso que mantemos são os nossos famosos arquivos: centenas de registos com a descrição precisa de cada peça produzida por Breguet desde o final do século XVIII até aos dias de hoje.
Qual é a sua obra-prima favorita da história e por quê? E qual da colecção actual?
Talvez o relógio Sympathic, este sistema extraordinário onde duas peças estão ligadas! Usamos o relógio de bolso durante o dia e quando regressamos a casa colocamo-lo no relógio de mesa, numa espécie de berço. Em seguida, o relógio de bolso é acertado, ajustado e recebe corda do relógio de mesa. Este mecanismo extraordinário e complexo é invisível. É um bom exemplo da filosofia Breguet: conseguir coisas altamente complexas mantendo uma aparente simplicidade. Sobre a colecção actual, aprecio especialmente a colecção Classique, e por quê? Porque, se me permite, os modelos foram, de certa forma, desenhados pelo próprio A.-L. Breguet.
A marca Breguet possui fortes ligações ao mundo marítimo, como demonstra a colecção Marine. Pode mencionar invenções ou soluções específicas da Breguet ao serviço do mundo da navegação marítima?
Ser o relojoeiro oficial da Marinha Real era o título mais prestigiado que um relojoeiro poderia ter. Breguet já estava envolvido como membro do Longitudes Bureau. Breguet melhorou os escapes do cronómetro de marinha; experimentou muitas soluções técnicas novas, como um cronómetro de marinha de quatro tambores, outro equipado com um dispositivo Turbilhão, e mudou o design dos movimentos do cronómetro para tornar as reparações mais fáceis e rápidas, para citar apenas alguns. Durante pelo menos 50 anos as grandes explorações marítimas foram realizadas com a preciosa ajuda de um relógio Breguet. Por exemplo, Dumont d’Urville chegou ao Pólo Sul em 1840 com um cronómetro Breguet. Para um cronometrista, foi uma estreia mundial.
Quais elementos do passado ainda podem ser encontrados nas criações modernas desta colecção?
As peças antigas da Breguet continuam a ser uma fonte de inspiração para os nossos designers e também para a equipa do nosso gabinete de estudos técnicos. Mas o objectivo não é copiar o passado, nem duplicá-lo. Serve apenas de inspiração. Por exemplo, no caso dos ponteiros, trata-se de uma nova interpretação dos ponteiros Breguet com algumas referências ao mundo marítimo. A colecção Marine, a terceira desde 1990, é importante para a Breguet porque remete para uma página gloriosa da nossa história. O Marine Hora Mundi, ou o Marine Turbilhão com equação do tempo são, na minha opinião, duas peças importantes que simbolizam e representam o passado e o presente da Breguet. Estas duas peças são os navios almirantes da nova colecção Marine: uma colecção muito contemporânea e repleta do ADN da marca.