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COMO AS VIAGENS TRANSFORMARAM A RELOJOARIA

A forma como controlamos o tempo mudou consideravelmente ao longo da história da humanidade. Desde a utilização de relógios de sol e de água, passando por relógios mecânicos e, mais tarde, por relógios regulados por satélites. As viagens à escala local e, mais tarde, à escala global, têm sido uma força motriz fundamental por detrás destas mudanças e inovações. 

 

 

À medida que os meios de viagem se tornaram mais eficientes e o mundo ficou cada vez mais pequeno, os mecanismos para contar o tempo que passa foram, também eles, mudando para acompanhar o progresso. De facto, se olharmos para a história, cada avanço nos transportes parece ter anunciado um avanço semelhante na relojoaria.

A era da exploração foi um período emocionante da história, quando o mundo começou a expandir horizontes para além da distância que um cavalo podia percorrer. À medida que os impérios tomavam forma e as superpotências reclamavam terras nos quatro cantos do globo, faziam-no utilizando formas de navegação hoje consideradas rudimentares. O sextante era a ferramenta que todos os aspirantes a capitão e imediato tinham de dominar, utilizando a posição do sol e de certas estrelas para determinar a sua localização aproximada.

Durante gerações, a hora solar local era a forma como a hora era mantida em todas as cidades, vilas e aldeias, sendo cada uma ligeiramente diferente da anterior, devido às diferentes posições de longitude. Embora isto possa não ter sido um grande problema para aqueles que faziam a viagem a cavalo, para os que começaram a deslocar-se entre continentes, estas diferenças horárias eram importantes, uma vez que se deslocavam entre vários graus de longitude.

 

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BREITLING Navitimer GMT 41

 

À medida que os marinheiros atravessavam cada vez mais o mar alto, conseguiam estabelecer a sua longitude utilizando o sextante, utilmente associado a um cronómetro preciso, para determinar a posição do sol exactamente ao meio-dia. Enquanto o sextante era utilizado há séculos e era fiável no mar, os cronómetros não o eram tanto. O primeiro salto significativo na determinação da longitude graças a um dispositivo de cronometragem foi dado por Christiaan Huygens e os seus relógios de pêndulo. E, embora  estes relógios não funcionassem bem no oceano, a verdade é que os instrumentos inovadores de Huygens viriam a ajudar a mudar o mundo da astronomia, permitindo a cronometragem exacta dos acontecimentos no cosmos, a partir do solo.

Este desafio de manter a precisão da hora no mar era um problema sério. Tão sério, que levou à fundação do Observatório de Greenwich para catalogar as estrelas. A esperança era que isso conduzisse a leituras mais exactas no futuro. Embora este processo tenha começado em 1675, tivemos de esperar mais um século para que o problema da Longitude fosse finalmente resolvido.

John Harrison, carpinteiro e relojoeiro, dedicou-se a resolver a questão em causa. Produziu, numa sucessão bastante rápida, quatro cronómetros que pensava poderem enfrentar o desafio. Entre eles destacou-se o H4. Mais pequeno e com uma forma semelhante à de um grande relógio de bolso, foi montado numa caixa de madeira. No interior, havia uma grande roda de balanço, que batia cinco vezes por segundo e tinha oscilações maiores do que o escape normal dos relógios de bolso. Em 1761, William, o filho de John, obteve o direito de testar o H4 numa viagem à Jamaica, na qual este teve um desempenho excelente. O novo cronómetro conseguiu prever um desembarque na Madeira mais cedo do que o esperado pela tripulação.

 

Os caminhos-de-ferro e os fusos horários

O próximo salto em frente na contagem do tempo é menos tecnológico do que o anterior, mas ainda assim profundo no seu impacto. Como mencionámos anteriormente, a hora solar local era a forma como todas as cidades, vilas e aldeias controlavam o tempo desde o século XIV. No entanto, mesmo em países relativamente pequenos havia discrepâncias na hora solar.

Esta diferença na hora local era apenas um ligeiro inconveniente até que as viagens foram aceleradas graças à expansão dos caminhos-de-ferro. Tentar construir um horário quando cada estação funciona a uma hora ligeiramente diferente teria sido um pesadelo, razão pela qual, em 1840, a Great Western Railway foi a primeira a adoptar uma hora padrão em todas as suas estações. Conhecido como Greenwich Mean Time, este foi um dos primeiros passos para a introdução de um fuso horário. No entanto, só em 1880 é que a Lei da Definição da Hora entrou em vigor no Reino Unido, reunindo todo o país num único fuso horário.

 

LONGINES Spirit Zulu
MONTBLANC 1858 Geosphere

 

Sabe-se que a Grã-Bretanha sugeriu que o mundo adoptasse o GMT, sem variações dependentes da longitude - uma ideia rapidamente rejeitada por razões óbvias. Em 1878, o engenheiro e inventor canadiano, Sir Sandford Fleming, propôs um sistema de 24 zonas, separadas por 15° de longitude cada. Esta sugestão foi efectivamente adoptada pelas companhias ferroviárias americanas em 1883, o que, por sua vez, levou à Conferência Internacional do Primeiro Meridiano, realizada em Washington D.C. no ano seguinte. Foi aí que se acordou que o modelo de Fleming seria adoptado em todo o mundo, sendo Greenwich a localização da linha do meridiano de referência.

 

A influência da aviação 

À medida que o mundo começou a pensar mais internacionalmente, precisávamos de uma forma rápida de nos deslocarmos de costa a costa. Os comboios e os barcos eram fiáveis, mas não suficientemente rápidos. Entram em cena os pioneiros do início do século XX que tentaram tornar o voo tripulado uma realidade. Os principais foram os irmãos Wright e Alberto Santos-Dumont.

O inventor brasileiro e pioneiro da aviação tentou voar para os céus com as suas máquinas motorizadas, no final do século XIX e início do século XX. Um dos problemas com que se deparou foi o facto de os comandos dos seus aparelhos voadores serem muito manuais. No entanto, para registar os seus voos, ele precisava de poder consultar o seu relógio.

Tudo o que existia nesta época eram relógios de bolso, o que obrigava a tirar a mão dos comandos para ver as horas. Foi então que recorreu ao relojoeiro e amigo Louis Cartier, que se propôs resolver este problema. A sua solução foi um relógio de pulso de caixa quadrada, suficientemente claro para que Santos-Dumont pudesse saber, num relance, há quanto tempo estava no ar, mas suficientemente elegante para que o pudesse enfiar debaixo do punho do seu fato, quando estivesse em terra. Assim nasceu o primeiro relógio de piloto.

Desde então, o design arquetípico de um relógio de piloto evoluiu significativamente. Necessitando de um dispositivo de cronometragem mais preciso e robusto no ar, o estilo preferido passou a ser um mostrador preto mate, com algarismos de grandes dimensões e ponteiros luminescentes. Esta estética mais utilitária foi a escolhida pelas forças aéreas aliadas durante a Segunda Guerra Mundial.

 

 

GMT e a Idade de Ouro das viagens

O primeiro voo comercial regular teve lugar em 1914, entre as cidades de São Petersburgo e Tampa, na Florida. Esta "linha de barco aéreo" estava muito longe do que muitas pessoas consideram a Idade de Ouro das viagens aéreas, nas décadas de 1950 e 1960. O crescimento significativo dos aviões de passageiros nesta altura levou a que os voos comerciais se tornassem um elemento básico da vida de certas pessoas.

Aqueles que atravessavam regularmente estes fusos horários, mais frequentemente do que qualquer outra pessoa, eram os pilotos. Para os ajudar, foi necessário criar um novo tipo de relógio: o GMT. Integrando uma luneta de 24 horas, bem como um ponteiro das horas adicional, o GMT permitia a estes pilotos ver as horas na cidade onde tinham acabado de aterrar e no seu país, com um simples olhar.

Não se pode falar do GMT sem mencionar Louis Cottier. O filho de um relojoeiro aperfeiçoou, desde os anos 30, a arte de indicar as horas em dois fusos horários diferentes, no mesmo mostrador. Concebeu um mecanismo engenhoso e ultrafino, que mostrava simultaneamente as horas correctas em todos os fusos horários do mundo, através de um anel rotativo de 24 horas, e a hora local.

 

O espaço é o limite

O fascínio pelo espaço e pelas estrelas remonta a algumas das mais antigas conceptualizações do tempo, com os marinheiros a utilizarem a astronomia para se guiarem pelos vastos mares, por exemplo. Como uma extensão natural dessa tradição, o espaço sempre foi uma área de fascínio para os relojoeiros.

E assim chegámos à última fronteira. Até aqui, as inovações na cronometragem tinham-nos ajudado a conquistar os mares, a terra e os céus, e agora tinham de enfrentar as estrelas. Como muitos saberão, o Omega Speedmaster foi o primeiro relógio a chegar à Lua. Como poderão suspeitar, esta viagem não foi fácil. Para entrar na nave espacial, o relógio tinha de passar uma série de testes com margens de erro mínimas. Se um único teste falhasse, o relógio não era autorizado a entrar a bordo. O único dos três testados que passou com distinção em todos os testes foi o Speedmaster, da Omega.

A relojoaria percorreu um longo caminho desde os anos 1700 até ao que é hoje, com as marcas a criarem relógios feitos de materiais que nem sequer existiam no tempo de Harrison. Embora existam muitos factores que conduziram a esta mudança, é evidente que a forma como viajamos teve um papel significativo na forma como dizemos as horas. 

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